texto escrito por Sara Leão
Preparei-me para ler sobre casamento e, eventualmente, sobre o amor.
Preferi a contenção de Mathilde à luz do seu companheiro e globalmente amado Lotto. Mas, antes de mais, a contextualização. Lauren Groff estruturou Destinos e Fúrias em dois volumes, que acabaram unidos no mesmo livro. Cada um deles remete para uma personagem – Lotto e Mathilde. Cada (quase) meio livro escuta as vozes das figuras mitológicas convidadas para a cena: primeiro, a das tecedoras de destinos de deuses e humanos, as Moiras, e depois, as guardiãs de vinganças e castigos, as Fúrias.
Continuo a ter apenas um vislumbre do que é o casamento, do amor percebo saudavelmente muito pouco, mas cada vez sei melhor o que não é.
Preparei-me para ler sobre casamento e, eventualmente, sobre o amor. Ler é um processo de aprofundamento do pouco que sabemos sobre alguma coisa, por isso, sempre gostei muito de ler. Vão-se despindo camadas de ignorância, percebe-se menos, mas de forma mais astuta e precisa. Continuo a ter apenas um vislumbre do que é o casamento, do amor percebo saudavelmente muito pouco, mas cada vez sei melhor o que não é.
Lauren Groff certamente também gosta de ler e de acumular referências, prontas a tomarem a forma de romance: ecos de tragédia grega, o que delimita a tragédia da comédia, como se intersecciona o presente com a mitologia clássica. Onde assenta a identidade, oh, ser tão definido como um mito. Aqui e ali, algum Freud.
A forma caricatural, veloz, como Mathilde surge na segunda parte do livro, nas “Fúrias”, reforça a personagem traçada na primeira, por oposição a Lotto. Sempre por oposição e em dualidade. É um casamento, um amor e um livro que funciona, mas sempre em antagonismo, há que abandonar desde logo a ideia de igualdade. As histórias dos dois, na narrativa de cada um, são feitas de silêncios e omissões, que decorrem lado a lado. Há justiça? Há privilégios, exploração de vulnerabilidades, dependência e o desejo, que tudo une.
Estou tentada a reler Destinos e Fúrias na versão original, em inglês, dadas algumas derrapagens graves de tradução. Ainda assim, a linguagem sobrevive. Lauren Groff é a escritora artífice, que, às vezes, se apaixona pelo que cria e acaba por polir demasiado certas peças. Chamam-lhe escritora ambiciosa.
«O coração de Mathilde era amargo, vingativo e rápido. [Verdade.]
O coração de Mathilde era bondoso. [Verdade.]».
Destinos e Fúrias são páginas cheias de socalcos, de palavras que são boas.
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