Começar a construir – Laboratório Curiosidade #1

A mulher sempre existiu na literatura, não só como modelo de representação. Falo também da mulher escritora. Desde Safo, na Grécia antiga, passando por Murasaki Shikibu (escritora do Genji Monogatari, considerado o romance mais antigo da história) até Sophia de Mello Breyner Andersen escritora portuguesa do século XX. 

Apesar de todos os nomes que podemos encontrar, a literatura escrita por mulheres continua a ser desconhecida. Por exemplo Emily Brönte, autora do Monte dos Vendavais, assinava com o pseudónimo masculino Ellis Bell. Existe a possibilidade de que algumas obras de F. Scott FitzGerald, um dos escritores norte americanos mais importantes do século XX, sejam em verdade de Zelda, a sua esposa. 

A revolução feminina e o movimento feminista foram (e são) fundamentais para retirar do anonimato e da estigmatização as mulheres que foram invisibilizadas ao longo da história. 

Depois da segunda metade do século XX estabeleceram-se diferentes teorias que procuram compreender melhor a escrita desenvolvida por mulheres. Entre estas teorias destacamos principalmente duas vertentes. A primeira é a que analisa a escrita feminina desde o género, e propõe a existência de uma literatura feminina. A segunda analisa a relação entre mulher e indivíduo e o seu contexto, e como isto afeta o processo literário. 

O estabelecimento de uma teoria literária feminina teve diferentes momentos, que não só nos permitem conhecer conceitos através dos quais se foi construído a literatura criada por mulheres desde a crítica, mas também entender a relação simbólica das autoras com a sua própria escrita. 

No primeiro encontro do Laboratório Curiosidade vamos pensar e criar juntas sobre:

1. O que se entende como literatura feminina?
2. Escolas do pensamento da crítica literária feminina desde o contexto da primeira e da segunda vaga do movimento feminista.

O Laboratório Curiosidade, faz parte do Laboratório de Memória Feminista.
São um conjunto encontros práticos para explorar o material recolhido nos encontros do Clube da Diaristas e criar com base no mesmo. Vamos contar as nossas histórias através de textos visuais, zines, microrelatos, fotografia… tens mais informação aqui»»

 

Procurar ideias com Susan Sontag

Eu e Susana Sontag

Retrato realizado por Juan Bastos
Retrato realizado por Juan Bastos


Comecei a explorar a escrita de Susan Sontag mas demorei algum tempo a entrar no universo dela.

Seduziu-me quando comecei a ler os seus diários, como a própria Sontag diz o diário é um material em bruto que permite encontrar a autora na primeira pessoas, um ego desprovido das máscaras que são as suas obras.

Durante décadas Susan Sontag registou nos seus diários a sua personalidade tal como ela a percepcionava e a sua vida como a tinha vivido. Durante semanas fui descobrindo a sua experiência vital, por amores, por leituras, por viagens, por doenças… a sua particular intensidade. 

Nos seus diários não encontramos a celebrada crítica cultural, a narradora e cineasta, admirada quer pela sua singularidade e inteligência como questionada pela sua egolatria e arrogância.. encontramos a sua extrema curiosidade pela escrita, pelo cinema, pela linguagem, pela vida. 

Encontramos as suas obsessões quotidianas e descobrimos como a leitura e a escrita são para Sontag uma forma de pensar.

Pensar e saber são uma experiência corporal por isso os seus diários são pequenos fragmentos dela própria, por vezes incoerentes, dispersos, elípticos e às vezes um simples bloco de notas e citações.

Sontag não estava minimamente preocupada, nos seus diários, com (re)contar coerente e completamente a si mesma ou aquilo que vivia ou pensava.  Contudo, através dos seus apontamentos desconexos, das suas notas para futuros projetos, as listas, infinitas listas que Sontag adorava fazer e nomes, nomes de muita pessoas, algumas famosas hoje, construí(mos) na nossa cabeça um (auto)retrato dela.

Ao terminar os diários decidi fazer uma lista em jeito de homenagem a Sontag, porque eu como ela, tenho uma pequena obsessão por listas.
Fiz uma lista das coisas que me cativaram na leitura dos seus diários e nela própria.
Lista à qual regresso e que se transforma agora, num mapa cartográfico para traçar o cérebro e o coração do primeiro encontro do Clube das Diarista.

No dia 14 de Janeiro 2020 vamos ter o primeiro encontro do Clube das Diaristas, vamos explorar passagens do cérebro e do coração de Susan Sontag, vamos procurar ideias e procurar-nos a nós mesmas nas suas anotações e construir uma constelação de referências através das suas listas, de viagens, livros, filmes, artistas… que nos possam servir de gatilho criativo para nos abrir caminho através dos silêncios, daquilo que desapareceu, do impensado e do não falado. 

Ler em conjunto passagens dos diários de Sontag que se transformam em buracos invisíveis da realidade onde a escrita encontra o seu caminho perguntando quem rompe esse silêncio e sobre o tipo de silêncio que se rompe. 

Dia 14 de Janeiro vamos começar (e/ou continuar) a romper o silêncio com o Clube das Diaristas. Mais informação aqui»»